sábado, 3 de julho de 2010

Capítulo I

Mandy desviava das poças em passos rápidos, tentando chegar até sua casa. Não mantinha o olhar reto, apenas no chão, e as mãos permaneciam nos bolsos de sua jaqueta. Respirava como se estivesse cansada de andar, mas na verdade aquilo significava que ela estava perdida. Não que ela não conseguisse achar o caminho de casa, mas é que ela não sabia realmente o que fazer. Esse, o sentido de perdida.

Ela havia acabado de sair do escritório de seu pai, sua única família desde os cinco anos. E a conversa que eles tiveram não foi muito animadora. Na verdade, foi o que a deixou perdida. Ela estava indo para casa apenas para pensar em tudo que ele havia dito. Não era ruim, mas era estranho.

Sentiu duas ou mais gotas minúsculas de água molharem o topo de sua cabeça e olhou para cima, na intenção de ver se, de onde vieram essas viriam mais. Sim, mais algumas tocaram seu rosto. Ela procurou andar ainda mais rápido. Arregaçou a manga da jaqueta para olhar seu relógio. O tempo parecia ter parado, naquele dia. Ela suspirou e esticou novamente a manga, fazendo com que cobrisse seus dedos. Ela dizia que só sabia andar assim.

A chuva começou a aumentar, mas deu tempo de ela subir os quatro degraus para a varanda de sua casa e abrir sua mochila para procurar suas chaves. Agora sim sua respiração era de quem estava cansada de andar. Ao entrar, pouco se preocupou em trancar outra vez a porta, jogou a mochila no meio do caminho e abriu o zíper da jaqueta enquanto se rastejava até o sofá, onde se jogou, sem querer pensar em mais nada. Fechou os olhos.

Imediatamente, o telefone tocou. Ela temeu que fosse Annie, sua melhor amiga. Mandy engoliu seco e levantou-se num pulo para atender. Era ela. Determinou-se a, em hipótese alguma, comentar sobre qualquer coisa a respeito da conversa que havia tido com seu pai. Comentaram sobre garotos, sobre as tarefas da escola, sobre o clima, as séries da TV. Então Mandy se traiu.

- O que você acha do Canadá? – perguntou, dando-se conta, imediatamente, do que havia dito, revirando os olhos, buscando um meio de desfazer a pergunta. Tarde demais.
- Frio. – Annie respondeu como se fosse nesse sentido que Mandy tivesse perguntado. Como se fosse mais óbvio do que realmente é.
- É, tem razão.
- Por quê?
- Nada. Estava vendo algo sobre isso na televisão. – ela mentiu. Nisso ela era boa. Logo mudou de assunto.

Continuaram conversando por mais algum tempo. Depois que desligaram, Mandy foi tomar banho. Um banho quente em sua banheira era tudo que ela precisava. Subiu as escadas com todo o cansaço do dia, deixando um pouco em cada degrau e tentou chegar o mais rápido possível dentro de seu banheiro, dando passos incrivelmente largos. Enquanto a banheira enchia, ela prendia os cabelos num coque alto, tirava a maquiagem e preparava a roupa que colocaria depois. Era quinta-feira, dia em que ela saía para jantar com seu pai.

Entrou quase completamente na banheira, tomando o cuidado habitual para não molhar os cabelos, já que havia lavado no dia anterior. Fechou os olhos e tentava não dormir, porque não havia sido nada agradável quando isso aconteceu pela última vez. Quando sentiu seus dedos enrugarem, esticou o braço para pegar sua toalha na cadeira que estava ao lado.

Vestiu seu vestido azul marinho, com um casaco leve de lã cinza, meia-calça preta e sapatilhas também cinza. Prendeu algumas mechas da frente de seu cabelo, para trás, formando uma trança, e deixando o resto do cabelo solto. Passou uma maquiagem leve e desceu. Seu pai havia acabado de chegar e estava organizando suas coisas. Olhou para ela, enquanto descia as escadas.

- Você não se cansa de ser linda assim? – ele perguntou, realmente admirando a beleza de Mandy.

Suas bochechas esquentaram e ela terminou de descer. Ele a abraçou e continuou olhando para ela. Ela era realmente uma garota maravilhosa. Tinha a pele bem clara e os cabelos eram loiros, mas puxavam para o castanho, iam até a metade das costas – ela dizia que já havia passado o tempo de cortá-los –, era bem magra e tudo nela era bem leve. Os olhos, o sorriso, as mãos, o jeito de falar, de andar. Parecia uma princesa.

Tinha dinheiro. Muito, para ser clara. Podia ter o que quisesse e quanto quisesse e, de fato, tinha. Mas, ao contrário do que mais se via em Nova York, ela não se aproveitava disso, nem era como as outras garotas. Não fazia as coisas erradas só por prazer, por interesse ou popularidade. Não gostava muito do que os outros faziam. Mas, em tudo que fazia, Mandy sentia um vazio. Como se nada pudesse preenchê-la.

Ficou na sala esperando seu pai enquanto ele tomava banho e se aprontava para saírem. Decidiu usar o notebook enquanto esperava. Pesquisou sobre o Canadá na Internet, sem muito ânimo, era só para saber o que encontraria por lá. Leu artigos sobre culinária, turismo, educação e voltou à página inicial. Nada parecia animá-la tanto.

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